A produção forrageira varia ao longo do ano, atingindo o valor mais elevado nos meses de Primavera e Verão e o valor mais baixo nos meses de Inverno (Salgueiro, 1982). Esta variação torna difícil adequar o número de animais ao potencial produtivo da superfície forrageira da exploração. Por isso, os agricultores começaram a armazenar o excesso de produção forrageira de um período do ano, para terem alimento suficiente no outro período em que esta escasseava. Inicialmente o processo de conservação era feito através da desidratação das plantas, produzindo-se o feno ou as palhas.
Contudo, porque na época em que se faz a fenação é comum a ocorrência de chuvas, os agricultores optaram pela ensilagem para conservarem as suas forragens. Além disso, o processo de ensilagem é mais eficiente na preservação da matéria seca do que o processo de fenação. A planta mais utilizada para a ensilagem é a do milho, pois é de fácil conservação, tem muita energia disponível e apresenta produções elevadas nos solos férteis do Entre Douro e Minho. Contudo, outras espécies de gramíneas também são ensiladas, como sejam o azevém, o centeio e a aveia, como forragem única ou complementadas com algumas leguminosas, como os trevos e a ervilhaca.
A ensilagem e as bactérias que a promovem.
Existem vários tipos de microrganismos que, pelo menos durante uma parte do seu ciclo de vida, vivem no interior das plantas sem as prejudicar. A esta população de microrganismos chama-se população endofítica (Hardoim, et al., 2015). Entre estes microrganismos, encontram-se bactérias cujo objetivo é reciclar os elementos químicos caso a planta morra. Quando se pretende conservar a forragem o objetivo é diminuir a atividade destas bactérias destruidoras em benefício de outras que protejam a matéria seca da destruição. No Gráfico 1 podemos observar a quantidade de bactérias existente em três espécies de plantas utilizadas como fonte de forragem.
Gráfico 1. Contagem de bactérias endofíticas em diversas forragens verdes. Adaptado de (Marley, 2014).
As mais desejáveis são as bactéricas lácticas homofermentativas, que transformam todos os açúcares em ácido láctico, ou as bactérias heterofermentativas facultativas, que transformam os açúcares em ácido láctico e algum ácido acético.
Se a compactação e fechamento do silo foram adequados, a disponibilidade de oxigénio será muito limitada. Neste ambiente com pouco oxigénio o desenvolvimento das bactérias lácticas, promotoras da fermentação, é mais favorecido. Quando o número de bactérias láticas é elevado assumem rapidamente o controlo da fermentação, acidificam o meio e reduzem a destruição da energia e a degradação da proteína presentes na matéria seca da forragem (Han, et al., 2014). Ao adicionarmos, pelo menos, o dobro das bactérias láticas (Pahlow, 1991), através da utilização de inoculantes, promovemos o controlo rápido do processo fermentativo no silo.
Contudo, quando a 1ª geração de inoculantes chegou ao mercado, apesar de possuir estirpes de bactérias lácticas bastante eficientes e que conseguiam baixar rapidamente o pH do meio, produzia silagens instáveis e que refermentavam mais rapidamente na manjedoura (Weinberg & Muck, 1996). Descobrimos mais tarde que esta maior instabilidade era devido à rápida diminuição do pH do meio, que impedia que outras bactérias produzissem ácidos com efeito antifúngico (Danner, et al., 2003). Esta baixa concentração de antifúngicos permitia que as leveduras e os bolores se desenvolvessem rapidamente após a abertura do silo, destruindo o ácido lático e abrindo caminho a que outros microrganismos destruíssem a matéria seca da silagem e promovessem o seu aquecimento (Weinberg & Muck, 1996). Deste modo chegou ao mercado uma 2ª geração de inoculantes que, além de incorporarem bactérias que produziam ácido láctico, possuíam também bactérias que produziam agentes antifúngicos como o ácido acético ou o ácido propiónico. Deste modo, estes inoculantes conseguiam fazer a primeira fase da ensilagem, a fase fermentativa, mas também a última fase, a desensilagem da forragem, quando esta é sujeita à presença do oxigénio e terminam as condições anaeróbias do meio.
A influência dos inoculantes no desempenho dos animais
Após décadas de utilização de inoculantes no controlo do processo fermentativo da ensilagem, o objetivo de proteger a matéria seca da forragem está praticamente conseguido (Han, et al., 2014). Contudo, verificou-se muito cedo que os efeitos dos inoculantes não se limitavam ao controlo do processo fermentativo. Foram observados efeitos positivos no desempenho dos animais que se alimentavam com a forragem tratada, como se pode observar no Gráfico 2.
Gráfico 2. Percentagem de estudos em que os inoculantes das silagens melhoraram a fermentação ou o desempenho dos animais (Weinberg & Muck, 1996).
Parte desses efeitos devem-se à atuação de algumas estirpes de bactérias, ou enzimas, presentes nos inoculantes que atuam nos nutrientes da forragem aumentando a sua digestibilidade. Atualmente está no mercado a 3ª geração de inoculantes que, além dos benefícios na fermentação e estabilidade aeróbica da forragem, promove a melhoria nutricional da silagem tornando os nutrientes mais disponíveis para serem utilizados pelos animais (Addah, et al., 2014).
A outra parte dos efeitos poderá ser exercida no próprio animal que se alimenta da silagem. Provavelmente algumas estirpes de bactérias utilizadas nos inoculantes atuem como probióticos (Han, et al., 2014), influenciando, logo no rúmen, a modulação da fermentação ruminal e a digestibilidade da fibra e, mais à frente nos intestinos, a estimulação do sistema imunitário (McAllister, et al., 2011). Atualmente, a investigação está centrada nesta 4ª geração de inoculantes que, além de fazer tudo o que os inoculantes anteriores fazem no silo, atuará ao nível do sistema digestivo do animal, melhorando o seu desempenho e a sua saúde.
Benefício económico da utilização dos inoculantes
Por muito boa que seja a ação dos inoculantes na conservação da silagem e do seu valor alimentar, para o agricultor só faz sentido a sua utilização se os benefícios económicos que apresentam forem superiores aos custos acrescidos que ele tem. Alguns investigadores (Bolsen, et al., 1992) compararam silagens inoculadas com silagens não inoculadas. Concluíram que a recuperação de matéria seca (a diferença entre a quantidade de matéria seca que foi colocada, e aquela que foi retirada do silo) foi superior em 1,2% nas silagens inoculadas em relação às silagens não inoculadas (91,1% vs 89,9%). Além disso, quando forneceram essas silagens a vitelões em engorda os valores da eficiência de conversão do alimento em carne e do ganho médio diário foram mais elevados nos animais que comeram as silagens inoculadas. Os autores concluíram que cada tonelada de silagem inoculada permitia produzir mais 2,77kg de carne, relativamente à silagem não inoculada. Outro trabalho concluiu que a inoculação da silagem estava associada a um aumento médio da produção de leite de 0,37lt por vaca e por dia (Oliveira, et al., 2017). Além disso, detetaram uma tendência para as vacas aumentarem a ingestão de matéria seca e o leite produzido possuir os teores de gordura e de proteína mais elevados.
A utilização de inoculantes nos processos de ensilagem é uma tecnologia em expansão e que tem vindo a alargar o seu raio de ação. Estando praticamente assegurado o seu primeiro objetivo de proteger a forragem ensilada da destruição ou degradação, tem-se vindo a trabalhar noutras áreas igualmente importantes, como sejam a melhoria da qualidade nutricional da forragem durante o seu armazenamento. Contudo, as pesquisas mais recentes tentam perceber de que forma poderemos utilizar os inoculantes para, mantendo todas as características conseguidas até agora, adicionalmente ajudar o animal a aproveitar melhor a forragem e, ao mesmo tempo, fornecer-lhe mais saúde. O objetivo é fornecer ao animal um alimento melhor, no aspeto nutricional, e que promova a manutenção da boa saúde diminuindo a utilização de antibióticos.
Eng.º Manuel Diogo Salgueiro, Ucanorte XXI